
Pelo Coração de Etéria
A quinta e última temporada de “She-Ra e As Princesas do Poder” encerra uma divertida, profunda e interessante série animada.
Nota da Colab: o texto contem spoilers.
SShe-Ra e as Princesas do Poder (2018-2020) estreou em meio a muita expectativa devido ao histórico da poderosa guerreira, que nasce na versão original de 1985. A nova produção provocou burburinhos ao trazer a guerreira como uma adolescente, desagradando os antigos fãs do desenho. Além disso, os visuais das personagens também foram alterados: a imagem mais sexualizada das figuras femininas foram descartadas e a animação serviu com destreza uma representatividade adorável, capaz de juntar a família e amigos na sala para maratonar cada temporada.
O desenho da Dreamworks chamou a atenção com um enredo cativante, contando acontecimentos de personagens que são fáceis de associar a qualquer momento de nossas vidas. A construção da história nessas cinco temporadas seguiu a fio a coerência, tratando de assuntos considerados tabus com a devida naturalidade.
Assim, a quinta e última temporada de She-Ra e as Princesas do Poder chegou na Netflix no dia 15 de maio de 2020, contando com treze episódios que retratam a amizade das princesas e seres mágicos do reino de Etéria e a união deles contra as forças do mal do Mestre da Horda (Keston John). O novo ano dá continuidade a jornada de Adora/She-Ra (Aimee Carrero), Arqueiro (Marcus Scribner), Ventania (Adam Ray) e seus companheiros na missão de salvar a princesa Cintilante (Karen Fukuhana) do poder do antagonista, capaz de controlar seus seguidores com uma espécie de chip, tornando-os “fanáticos” que entoam o coro sinistro “expulse as sombras” e “todos os seres devem sofrer para se purificar”. O foco em manter Cintilante prisioneira é atrair a guerreira She-Ra para que, assim, o poder das forças do mal seja fortalecido e o Coração de Etéria seja dominado, ficando sob o total controle do Mestre da Horda.
A temporada conta com o desenvolvimento e evolução de personagens como a Felina (AJ Michalka) e Scorpia (Lauren Ash), que mostram algumas condições como insegurança e baixa autoestima, causados por traumas e abandonos, possíveis de reconhecermos em nós mesmos e criar uma conexão com as mesmas. Felina cresceu ao lado de Adora, mas como conta a série, sempre se comparou com a personagem principal e se sentiu diminuída ou insegura mesmo Adora deixando claro que sempre esteve ao lado de sua amiga e seria seu suporte. Felina não baixava a guarda e não permitia se entregar a amizade na mesma proporção que Adora, ainda sendo muito subestimada por Sombria. A personagem de AJ Michalka segue a trama como uma personagem insensível e motivada por sentimentos de ódio até que se viu frente a possibilidade de seguir um caminho diferente, tratando de seus traumas e deixando de seguir o caminho como a antagonista digna de pena.

She-Ra e as Princesas do Poder segue uma história que valoriza personagens e resolve seus núcleos secundários, engatando em um ritmo desenvolvido onde os laços são bem dados e narrativas se desenrolam com naturalidade e coerência – algo que poderia ser difícil manter devido a quantidade de histórias e arcos adicionados ao decorrer das temporadas anteriores. As relações dos personagens são muito valorizadas e o foco para cada acontecimento é bem dosado, levando a um final incrivelmente adorável onde sentimos vontade de seguir acompanhando o futuro de cada personagem.
É bom frisar que o seriado animado definitivamente não agrada aos preconceituosos de plantão – e isso é ótimo! Afinal, há tempos somos bombardeados por produções de conteúdo heteronormativo, dominado por personagens brancos e que seguem um padrão de gêneros imposto pela sociedade. She-Ra e as Princesas do Poder chegou para agradar toda a comunidade que tem orgulho de ser quem é. A representatividade está na construção de uma narrativa onde tem casal gay, casal lésbico e uma amizade como ela é (pura, com alguns maus entendidos, mas repleta de respeito e companheirismo). Ainda, há a pluralidade e o conforto de que podemos assistir percebendo que muita gente está ali sendo representada e ganhando visibilidade, além de mostrar também inseguranças e questões psicológicas que devem ser tratadas em nós humanos.

Um desenho que em cinco temporadas maravilhosas trouxe personagens profundos, com questões reais em um mundo mágico e fantasioso, foi capaz de colocar numa das maiores plataformas streaming uma deliciosa aventura com personagens protagonistas e princesas de fato poderosas. O misto de sentimentos e humor encerra a produção deixando um exemplo a ser seguido, que humaniza personagens e se adapta às questões que devem ser tratadas, mostrando ideias a serem desconstruídas na atualidade. She-Ra e as Princesas do Poder cativou e acaba nos deixando a nostalgia e melancolia com aquele desejo de seguir acompanhando as aventuras de cada personagem nesse novo mundo de Etéria.