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BoJack Horseman retorna para sua quinta temporada na Netflix ainda mais ácida e realística, novamente adentrando na vida problemática do protagonista.

BoJack Horseman retorna para sua quinta temporada na Netflix ainda mais ácida e realística, novamente adentrando na vida problemática do protagonista.


Nota da Colab: este texto contém sérios spoilers da série.

 

ÉÉ com uma frase sutil e simples (“você diz que quer melhorar e não sabe como“) que o trailer da quinta temporada de BoJack Horseman começa e termina. Pode ser entendida como uma frase breve para descrever o personagem principal, mas, após a revisão do contexto, é a resposta para o final da quinta temporada que estreou na sexta-feira (14). BoJack Horseman é uma sitcom estadunidense lançada pela Netflix em 2014, cuja comédia é extraída do drama que cerca a vida do personagem principal: BoJack (Will Arnett) – personagem este que ganhou o público do streaming tendo sua renovação até a sexta temporada.

Criada por Raphael Bob-Waksberg, a série conta a história de um antropomórfico cavalo-humano que fez muito sucesso nos anos 90 em Hollywood, mas agora não mais. Além de estacionar sua carreira como ator e se transformar em uma múmia dos sucessos de Hollywood, BoJack comete erros, vive bêbado e se vangloria de seu sucesso na série Horsin’ Around.

 

A Louca Vida de Um Cavalo

Segundo o primeiro episódio da série, em 1987 estreava a fictícia sitcom Horsin’ Around na ABC, criada por Herb Kazzaz (Stanley Tucci) e estrelada por Horseman. A produção, na qual um jovem cavalo solteiro reavalia suas prioridades quando concorda em criar três crianças humanas, foi rejeitada pelos críticos por ser fantasiosa, sentimental e ruim. Porém, a comédia familiar teve uma resposta positiva do público e ficou no ar por nove temporadas, sustentando o ego, dinheiro e fama de BoJack.

BoJack Horseman retrata o famoso cavalo, trinta anos depois, tentando voltar a fama com uma biografia. Uma perspectiva da série é o nonsense, ao ser ambientada em uma sociedade onde os seres humanos e animais antropomórficos vivem lado a lado, e apresentar seu melhor amigo, Todd Chaves (Aaron Paul), como um desconhecido que entrou de penetra em uma de suas festas, dormiu no sofá e nunca mais foi embora.

Somos aproximados de cada personagem ao longo das cinco temporadas. Princess Carolyn (Amy Sedaris), ou só PC, é uma gata rosa empresária e namorada de BoJack; a humana Diane Nguyen (Alison Brie) é a ghost writer da tal biografia e Mr. Peanutbutter (Paul F. Tompkins), um labrador quarentão, é a estrela de uma sitcom dos anos 90, cuja premissa é semelhante de Horsin’ Around,  acabando por ter sucesso (segundo o protagonista, as custas de seu próprio sucesso).

Da esquerda para a direita: Diane, Mr. Peanutbutter, BoJack, Princess Carolyn e Todd

Progressivamente, conhecemos o lado emocional e psicológico de cada um deles. O uso de flashbacks é explorado em todas as temporadas e revela o passado sombrio, triste e difícil tanto de BoJack quanto dos personagens secundários que fortalecem e diversificam a série, moldando o roteiro além da vida decadente da estrela do seriado dos anos 90.

 

A 5ª Temporada

Nessa temporada vemos BoJack como estrela de um novo seriado sobre drama policial chamado Phillbert que é dirigido por Flip McVicker (Rami Malek) e disponibilizado pelo site “What time is it rigth now?”. Sob esse pano de fundo, o novo ano mantem suas críticas a Hollywood, desta vez focada nos assédios sexuais e machismo presentes, tanto dentro quanto fora dos sets de filmagem. Tal foco é evidenciado pelo episódio BoJack, o feminista (S05E04), que apresenta como temática principal como os homens possuem voz, são perdoados e seus assédios morais ou sexuais são esquecidos pela indústria. A história narrada carrega o típico nonsense e exagero ao criar uma premiação para celebridades arrependidas de seus erros, em uma espécie de perdão nacional.

Além disso, a série mantém, desde sua primeira temporada, o constante trabalho metafórico, como o próprio uso de animais para trabalhar uma estrutura de uma fábula, assimilando também que cada animal é uma metáfora para as características de cada personagem. Princess Carolyn, por exemplo, é uma gata rosa por sempre conseguir “cair de pé” nos problemas que enfrenta, se safando ou conquistando algo sorrateiramente em seu trabalho como empresária. Mr. Peanutbutter é um labrador por sempre ser carinhoso, atencioso, otimista e brincalhão. BoJack é um cavalo por sempre se portar rígido, forte ou até grosseiro em relação as pessoas e situações de sua vida.

 

Saúde Mental

A vertente mais intensificada durante a quinta temporada é o lado psicoemocional de BoJack Horseman. Ao decorrer de todos os anos anteriores, nos deparamos com algum trauma, problema ou erro que o personagem teve na infância ou durante seu sucesso em Horsin’ Around.

Cartaz da quinta temporada da série, que estreou no dia 14 de setembro

Na primeira temporada, culpamos BoJack por suas atitudes imorais e comportamento rudes, não entendemos porquê o personagem foge de relações, evita demonstrar sentimentos ou toma atitudes antiéticas e imorais em muitas situações de sua vida. Ainda, o famoso cavalo tem o vício de tratar mal as pessoas ao seu redor e é extremamente egoísta, desconfiado, bêbado e sem nenhuma perspectiva positiva sobre o futuro.

A segunda e terceira temporada nos aproxima intensamente tanto da infância do personagem-título quanto da de sua mãe, ambas traumatizantes e determinantes para a construção da personalidade de ambos os personagens. A relação entre Beatrice Horseman (Wendie Malick) e filho é conflituosa, cheia de insultos e difamações que os dois trocam nos curtos e raros diálogos que possuem. BoJack teve uma infância complicada com pais que o rejeitavam ou o culpavam.

Beatrice se casou com o aventureiro Butterscotch Horseman (Will Arnett) por conta de uma gravidez indesejada. Herdeira de uma empresa de açúcar, ela não soube se acostumar ao mínimo conforto que Butterschotch podia oferecer trabalhando como operário em uma fábrica. Assim, com o passar dos anos, Beatrice e Butterscotch brigam tanto a ponto de esquecerem a presença e existência do filho. Em um lar caótico, BoJack nasce e cresce sentindo constantemente medo de seus pais e em completa solidão. E, a partir desse momento, enxergamos o personagem com outros olhos, mas ainda sem o isentar de suas culpas.

Retrato da família Horseman

O episódio Churros Grátis (S05E06) releva ao máximo o sentimento de BoJack em relação a sua mãe. O enredo se configura em um monólogo do personagem durante o funeral dela., onde ele desenrola um texto improvisado tentando descrever um pouco de sua mãe. O cavalo falha nessa tentativa e se sente frustrado ao perceber que passou a vida inteira tentando entender Beatrice, sem conseguir. O pouco de positivo que consegue descrever, é, de certa forma, triste, solitário e sombrio: “Minha mãe sabia como era passar a vida inteira se afogando, mas em alguns raros momentos ela se lembrava de que sabia nadar. Ela quase sempre se afogava”.

A infância de Beatrice foi marcada por um pai machista e opressor que, ao ver sua esposa em crises de ansiedade, após a morte de seu filho na guerra, deduziu histeria a obrigando a fazer uma cirurgia no cérebro que afetou sua capacidade de comunicação. Beatrice cresce com uma presença machista e ausência de atenção materna. BoJack transparece pouca tristeza ou comoção no funeral, mas em certas reflexões percebemos como personagem se sente desolado diante da morte da mãe por não ter, segundo ele, uma esperança de ainda conseguir ser um orgulho ou felicidade na vida da mãe.

Contudo, a raiva toma conta quando se depara com uma contradição. Ao ir em um fast food o personagem pede um churros a atendente que pergunta se ele está tendo um ótimo dia. BoJack responde que não, porque sua mãe faleceu. A atendente cai aos prantos e oferece o churros de graça. O personagem se revolta ao perceber que, uma atendente que nem o conhecia teve mais carinho e atenção com ele do que sua mãe em toda a sua vida.

O determinismo maneja as atitudes atuais de BoJack por variados motivos que estão em seu passado, e o personagem se culpa constantemente por suas atitudes erradas, embora nunca consiga parar de toma-las. O protagonista tem mania de vitimização, mesmo sabendo que suas ações foram erradas, dizendo para si mesmo que é quem mais sofre com as atitudes de BoJack Horseman.

Além disso, o cavalo não tem autoestima. Na quarta temporada, no episódio Seu estupido de m**** (S04E06), conhecemos os pensamentos de BoJack, narrados em off durante as cenas em ordem cronológica na história. Horseman é autodepreciativo na maioria de seus pensamentos, se contradiz muitas vezes e tenta parar de pensar bebendo, fumando ou se drogando.

Ainda, ele é depressivo, ansioso e muito pessimista, com uma saúde mental frágil, enxergando sempre o lado negativo das situações, cometendo erros repetidamente e esperando que as pessoas o perdoem ou digam que, no fundo, ele é uma boa pessoa. Sua busca por paz ou felicidade chega num extremo e o cavalo começa a se viciar em analgésicos fortes durante a quinta temporada, além do alcoolismo e vício em cigarro. O personagem não assume responsabilidade afetiva por não ter, nem com si mesmo, responsabilidade alguma. Assim, BoJack rejeita ajuda de outras pessoas por não querer se sentir inferior ou menos inteligente que os outros (seus pais chamavam muito ele de burro quando criança).

A frase “Você diz que quer melhorar e não sabe como” é dita por Diane, melhor amiga do cavalo e que tenta ajuda-lo ao perceber o nível de vicio, angustia e depressão que o amigo se encontra. Apesar dos erros que BoJack cometeu com Diane no passado, ela os ignora e tenta o convencer a procurar ajuda, sempre encontrando relutância por parte dele: “E se eu continuar sendo a pessoa horrível que sempre fui, mesmo assim?” , ele questiona, enquanto Diane insiste eu ele tem duas opções: “ir embora e resolver tudo do seu jeito, como fez a vida toda, ou pode ver o que eles têm a oferecer”.

Ao fim, BoJack Horseman entra para uma clínica de reabilitação, onde permanecerá ao longo de seis meses. Este então se torna um grande começo para a série e para ele, que finalmente decide pedir ajuda e optando por largar seus vícios.


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