fbpx
Em narrativa onírica, "Sempre em Frente" traz mensagem carinhosa e positiva sobre a beleza de enfrentar as dores e a melancolia da vida.

Em narrativa onírica, “Sempre em Frente” traz mensagem carinhosa e positiva sobre a beleza de enfrentar as dores e a melancolia da vida.


“Para visitar o planeta terra você terá que nascer como uma criança humana. Você vai crescer, viajar e trabalhar. Ao longo dos anos você tentará achar sentido daquela feliz, triste, cheia, vazia, vida em constante mudança em que você está. E quando chegar a hora de voltar para sua estrela, pode ser difícil dizer adeus para aquele mundo estranhamente lindo.” — Claire A. Nivola (Star Child)

SSempre em Frente, mais recente obra do diretor Mike Mills, abraça a construção da relação de aprendizado mútuo entre um adulto e uma criança para falar sobre o poder da memória.

Desde a escolha por filmar a película em preto e branco, enaltecendo assim o aspecto de uma estética concebida no passado, até olhares e pontuações entre os protagonistas. Tudo gira em torno da construção do que virá a ser lembrança. Pequenos momentos vividos que aos poucos vão ter seus detalhes corroídos pelo tempo, tornando-se assim apenas aquela imprecisa memória distante.

 

Sempre em Frente

Na obra, Johnny (Joaquin Phoenix) é um ocupado jornalista de rádio que vem realizando uma série de entrevistas com crianças de diferentes idades, e em diferentes cidades, fazendo perguntas como o que elas pensam sobre a vida, sobre o passado e sobre o futuro. A partir disso, ao abordar o aspecto documental que a tarefa do protagonista proporciona, Mike Mills explora cenas de entrevista com respostas não roteirizadas e incrivelmente profundas vindas do olhar particular de cada criança em cena.

“O que você pensa sobre o futuro? Como sua cidade irá mudar? Sua família será a mesma? O que você lembrará, e o que irá esquecer? Você se sente sozinho?” São estas algumas das perguntas feitas aos entrevistados ao longo da trama. Perguntas simples, diretas, fáceis de entender mas surpreendentemente difíceis de responder. Assim, em Sempre em Frente a poesia da pureza da resposta das crianças não mora na inocência, no sonho, e sim na sua verdade, e na maior parte das vezes, uma verdade repleta de esperança.

A partir disso, a trama começa a se desenvolver quando Johnny precisa estabelecer laços com seu sobrinho Jesse (Woody Norman), um garoto com quem pouco conviveu nos últimos anos. Após um telefonema de sua irmâ Viv (Gaby Hoffmann), Johnny recebe um pedido para ir até Los Angeles cuidar de Jesse por alguns dias. Tal fato ocorre pois Viv precisava tomar conta do pai do garoto, Paul (Scoot McNairy), que vem sofrendo com alguns problemas psiquiátricos e mora em outra cidade.

 

Constrastes e Poesia

É em meio à complexa situação descrita que Jesse demonstra toda sua profundidade. Para tanto, temos em Sempre em Frente grandes atuações de Joaquin Phoenix, e principalmente, Woody Norman, capaz de trazer força e profundidade necessárias ao personagem. Em suma, Jesse é uma criança como todas as outras, e assim, transmite também sua sabedoria através da tela.

As locações de Sempre em Frente fazem parte da composição narrativa, passando por Detroit, Nova York, Nova Orleans e Los Angeles, sendo apenas mais uma peça no quebra cabeças dos diversos contrastes que se apresentam durante a trama. Tais contrastes entre as locações exalam tanto interação do ambiente com seus personagens, como na crua realidade das crianças entrevistadas nas diferentes localidades.

Se em Detroit – no passado considerada a cidade do futuro mas hoje símbolo do colapso do velho sonho americano – a desesperança por vezes parece estampada em entrevistas documentais ou planos da fotografia, em Nova York vemos a clássica corrida da rotina e pluralidade cultural sendo reverberada.

Bom, é aí, no contraste do ambiente, que fica impossível não enaltecer a fotografia de Robbie Ryan. Em um filme que pretende desenvolver seus personagens de uma forma lenta e poética é extremamente necessária a execução de uma fotografia e trilha que também colaborem para a construção da atmosfera. Assim Ryan cria desde gravuras facilmente capazes de ser estampadas em cartões postais, como simples, porém belas colagens de planos em ambientes abertos e fechados. Por várias, e várias vezes me peguei deslumbrado pela beleza da filmografia em preto e branco de Sempre em Frente.

Junto da poesia vista na fotografia da obra moram as melodias de Bryce Dessner e Aaron Dessner, integrantes da famosa banda indie The National. A trilha é sabiamente revestida de vocais sussurrados, instrumentos de sopro leves, cordas, sintetizadores e delicados dedilhados no piano. Tais elementos suavemente alinhados são capazes de evocar à sensação de descobrimento constante que os personagens vivem na trama, colaborando de maneira recorrente com a emoção estampada no laço dos protagonistas.

A sinceridade desse laço mora nas conversas entre Johnny e Jesse. Desde profundas linhas de diálogo até a iminente irritabilidade que Jesse é capaz de provocar tanto no expectador, quanto em Johnny, Assim são construídos os nuances do que um dia virá a ser lembrança para os protagonistas, sendo em momentos simples e corriqueiros como o da leitura conjunta de um livro antes de dormir que o roteiro de Sempre em Frente brilha mais forte. Todos os livros que Johnny lê para Jesse – como Star Child, parafraseado no enunciado – trazem alguns dos temas abordados pela obra, sendo alguns livros infantis, outros livros para adultos, evocando frequentemente à lição do aprendizado mútuo e recorrente entre os dois personagens principais.

No fim, Sempre em Frente é uma obra sobre contrastes. Pequenos momentos geram grandes memórias. Pequenas perguntas trazem grandes respostas. Bom, que me perdoem o paralelo e o flerte com o brega, mas Mike Mills se apoia na pureza da resposta das crianças pra dizer aos quatro cantos que a vida por vezes pode até ser cruel mas acima de tudo é bonita, e como é bonita. Assim seguimos, dia após dia…sempre em frente.

Compartilhe

Twitter
Facebook
WhatsApp
Telegram
LinkedIn
Pocket
relacionados

outras matérias da revista

Back To Top