
Uma vida em segundo plano
“A Esposa” é um verdadeiro show de Gleen Close, que faz justiça à força que sua personagem precisa nesse retrato verossímil de relacionamentos abusivos.
PParece que Hollywood finalmente se deu conta da importância de retratar pessoas mais velhas nas telas e colocar atores veteranos em destaque. Produções como Grace and Frankie (2015–), Transparent (2015–) e a premiada O Método Kominsky (2018–) se destacam justamente por colocarem questões relativas ao envelhecimento em pauta. Em épocas de movimentos como o Me Too e Time’s Up, a indústria do entretenimento também passou a apostar em filmes que problematizam o machismo e apresentam mulheres fortes como protagonistas. Embarcando nessas duas tendências, o longa A Esposa é centrado nos conflitos de um casal da terceira idade – ou, mais especificamente, no arquétipo da esposa que passa uma vida em segundo plano, enquanto seu marido é prestigiado e vive cortejando outras mulheres.
A produção é cotada para as grandes premiações, especialmente por conta da excepcional atuação de Glenn Close, que interpreta a protagonista Joan Castleman. A atriz de fato consegue passar toda a aflição e complexidade de sua personagem com apenas um olhar ou um meio sorriso. O estopim de boa parte dos conflitos é a viagem que o casal realiza a Estocolmo para a cerimônia do Nobel de Literatura que Joe Castleman (Jonathan Pryce), o marido de Joan, receberá.
Desde a primeira cena, em que Joe insiste em fazer sexo com sua esposa e faz a sugestão de maneira consideravelmente misógina (acredite se quiser, muitas pessoas no cinema acharam essa insistência engraçada), é bem possível não se simpatizar com o personagem. No entanto, se o desafeto não acontecer “de primeira”, é difícil continuar gostando de Castleman depois de conhecer a fundo a trajetória do casal – inacreditavelmente, há quem justifique todas as ações sexistas do escritor (“ele é movido a testosterona”, “ele faz o que faz porque se sente inseguro”, entre outras).

A opressão sofrida pela a personagem de Close acontece em muitos níveis. Joan não só é diminuída publicamente pelo seu marido (que, descaradamente, diz para os amigos “ainda bem que ela não escreve”), como também sofre em casa, já que ela é totalmente responsável pelos cuidados domésticos – Joe não sabe cuidar nem da sua própria toalha de banho. A protagonista precisa aguentar ainda os olhares que seu marido lança para outras mulheres.

A direção de Bjorn Runge oscila entre planos longos e decupagens clássicas. Uma cena em especial chama atenção: a conversa de Joan e Nathaniel em um bar passa a ter seus quadros afunilados e apertados na medida em que a conversa se torna tensa e desconfortável para a protagonista. A presença do filho do casal, interpretado por Max Irons, se torna praticamente um acessório e é facilmente descartada. Seu drama, como um aspirante a escritor ofuscado pelo sucesso do pai, é até interessante, mas se torna pouco explorado na trama e parece não chegar a lugar nenhum.

No final das contas, o grande destaque de A Esposa é o show de Glenn Close, que de fato merece todo o prestígio que está recebendo. A atriz, que tem um portfólio e tanto, até hoje não foi premiada com um OSCARs, mas tudo indica que 2019 pode muito bem ser o seu ano. Se o longa é intitulado A Esposa, Close carrega o filme fazendo justiça ao peso e força que sua personagem precisa ter, mostrando as nuances de uma mulher forte que se destaca em um mundo misógino.
OSCARs 2019
Indicações: 1.
- Melhor Atriz: Glenn Close